É uma tragédia, mas, para quem sabe como a “roda” gira, concordará com algumas das causas que aponto abaixo.
1) A ideia de que o pastor é o super-homem
Não passa por lutas, não enfrenta tentações, não degusta fracassos, não sente medo, tem uma família perfeita, filhos maravilhosos, mulher/marido estonteante, finanças em dia, saúde estável, riso sempre presente no rosto, fé inigualável para enfrentar problemas, um milagre em cada mão. Leia aqui a notícia
2) O fetiche religioso que recai sobre a figura do líder
Ou seja, o desejo de ser aquela pessoa, de ter aquele “poder”, a inveja “santa” de possuir aqueles dons, aquela oratória, a tara na inteligência, na capacidade de influenciar pessoas, na habilidade de convencimento.
Quem vive no púlpito sabe como, por vezes, pastores são “comidos” vivos pela sua própria plateia dominical. Ora, ninguém sadio emocionalmente consegue conviver com isso e ficar imune.
3) A transformação da igreja numa empresa
Onde o pastor vira o CEO, administra expectativas, gerencia finanças, busca bater metas numéricas, cuida do patrimônio físico, realiza eventos de “colheita” para engordar o “curral” com “gado” novo, indica pessoas para os “cargos” eclesiástico e as gerencia, tudo isso somado as demandas de casar, enterrar, batizar, visitar, aconselhar, pregar, orar, estudar, etc.
4) A solidão imposta pelo rito sacerdotal, ou seja, a imposição de não confiar naqueles que estão um pouco mais próximos a ele
Uma vez que a maioria dos membros deve manter a distância regulamentar que produz o mito. Via de regra, sua casa é devassada, sua intimidade, não raro, exposta, ele é alvo constante de fofocas maldosas e julgamentos perversos. Então, começa a se entrincheirar, esconde os dramas, maquia as dores, cria um personagem, vira um robocop da fé com alma de lata, nervos de aço e coração de pedra.
5) A necessidade de conviver com a política clerical,
Algo tão enjoativo que ninguém com um pouco de decência pode suportar. O rito eclesiástico expõe o pastor aos conchavos ministeriais, aos boicotes das instâncias superiores, por vezes, a enfrentar tribunais, sejam internos na própria igreja, sejam em instâncias hierárquicas da denominação, isso sem contar com a ideia de que o serviço pastoral é algo como uma carreira profissional, na qual você tem de acumular títulos para abrilhantar o currículo com vistas a conseguir galgar uma “igreja” maior e mais rentável.
6) O abandono do pastor
Em casos extraordinários, ou seja, se for assalariado pela igreja, normalmente o pastor não conta com previdência, seguros, etc. Num caso de desentendimento com a comunidade, será expulso com uma mão na frente e outra atrás. Canso de aconselhar pastores punidos por suas igrejolas e que tiveram seus rendimentos suspensos impiedosamente, algo de uma maldade sem precedentes, independente de qual tenha sido o caso, pois até empresas são mais solidárias com seus executivos do que igrejas com o pastor e a sua família.
7) A falta de uma segunda chance. Pastor não pode errar, a não ser que não seja descoberto.
Normalmente, um erro do pastor é fatal, e aqui entenda-se, obviamente, questões mais complexas, como dívidas, adultério, mentiras, vícios, etc. Ele convive com todas estas fraquezas dos membros que lhe circundam, trata com misericórdia os que lhe procuram, ouve confissões assustadoras, busca compreender o incompreensível, mas é sentenciado a morte se o que os outros fazem, sem maiores desdobramentos, acontecer consigo.
8) O esfacelamento da família.
Ora, vivendo com uma agenda louca, em busca de produzir “resultados” para o “Reino”, não há casamento que resista, além do total abandono dos filhos. 90% dos pastores que conheço tem graves problemas familiares, vivem da retórica do púlpito e da maquiagem da vida, equilibram-se sobre a navalha da insensatez, bancando o custo de sua alma para manter o “circo” funcionando. Pior do que isso é sustentar relações apodrecidas para que a “comunidade” se satisfaça com o modelo da “família perfeita”.
9) A trágica ideia de que Deus é um gestor, não um Pai de Amor, como afirmou o salmista Davi.
Sim, o “insucesso” ministerial, normalmente atrelado ao baixo crescimento numérico, leva o pastor a ter a sensação de que Deus não lhe abençoa, que ele não tem fé o suficiente, não é santo o suficiente, não trabalha o suficiente, não é “ungido” o suficiente. Isso, ao final, produz dois graves males: a comparação com outros pastores, que são “bem” sucedidos, e a sensação de esmagamento existencial, pois o sujeito imagina que Deus o abandonou e que ele está entregue nas mãos de satanás.
10) A falta de perspectivas na vida
Uma vez que a maioria dos pastores não tem outra formação, não possuem profissão, não tem qualificação para o mercado de trabalho. Assim, se uma destas questões postas acima acontecerem, e se ele ficar “desqualificado” ao ministério, perdendo seu “cargo” e seus proventos, não tem mais o que fazer na vida, não há para ele horizontes, pois não tem, sequer, como manter a família com o mínimo necessário.
Nordestino com orgulho, pernambucano de Recife, tem 32 anos de convertido e 49 anos de idade. É casado há 24 anos com Fabiana e tem uma filha, Gabriela, de 14 anos.